Sunday, July 29, 2007

«Navio Gil Eannes: fugir da doença para ganhar conforto»

(Fotografia de [Luís Miguel Correia])
«Ainda em terra, para contar histórias de um passado e albergar vidas no presente, o “Gil Eannes”, que foi navio-hospital de apoio à frota bacalhoeira está ancorado em Viana do Castelo. Mas vários gostariam de voltar a vê-lo navegar. (Continua em comentário a este post).
* * * * *
ADENDA: Pede-se a quem souber o nome do capelão do Gil Eannes no final dos anos sessenta que nos informe.

9 comments:

pereira de oliveira said...

bem-haja por este post!
se houvesse algu�m que me dissesse o nome de um capel�o do Gil Eanes no final dos anos sessenta do s�culo passado ficava muito agradecido, por isso digam-me o nome dos que souberem...mal o leia lembro-me logo...bem-hajam

Raquel Sabino Pereira said...

VOU LANÇAR O APELO!

Raquel Sabino Pereira said...

CONTINUAÇÃO DO POST:

«Ainda em terra, para contar histórias de um passado e albergar vidas no presente, o “Gil Eannes”, que foi navio-hospital de apoio à frota bacalhoeira está ancorado em Viana do Castelo. Mas vários gostariam de voltar a vê-lo navegar.


A reputação de que o “Gil Eannes” gozou durante duas décadas, como navio-hospital de apoio à frota bacalhoeira, levou pescadores a fingirem-se doentes para obterem mais conforto, melhor comida, aguardente, cigarros e reencontrarem amigos e familiares.Pedro Lima Ribeiro, 74 anos, embarcou em 1958 como electricista. Durante os oito meses em que esteve a bordo do “Gil Eannes”, apanhou “muitos sustos com os temporais” mas conseguiu resgatar, com os companheiros de viagem, os tripulantes de oito navios portugueses que, nesse ano, naufragaram nos mares gélidos da Terra Nova e da Gronelândia. “Conseguimos salvar todos, não morreu ninguém”, recorda, acrescentando que, várias vezes, teve de “saltar” também para embarcações para resolver “problemas de motores que se queimavam”. O antigo tripulante refere-se ao “Gil Eannes” como um “barco de luxo”, comparando-o aos navios da frota bacalhoeira, onde “os pescadores passavam muitas privações, não tinham água para fazer a sua higiene, dormiam com as roupas de oleado e comiam feijão, batata, arroz e carne de barrica”.


“No Gil Eannes não faltava nada. Havia fabrico diário de pão com farinha americana, camarotes isolados, lavagem de roupa, água para banho, telegrafistas em permanência e uma das melhores salas de operações do país”, salienta, adiantando que, duas vezes por semana, a tripulação comia acepipes como salsichas, ovos e doces.Não admira, pois, que “alguns pescadores fingissem dores de estômago e dentes” para poderem visitar a embarcação e “ganhar conforto, reencontrar companheiros doentes, amigos, familiares, comer melhor, pedir aguardente, cigarros, mudar de ambiente e falar de outros assuntos com outras pessoas”, conta Pedro Ribeiro.


Pedro Abreu Loureiro, que era ainda um médico recém-licenciado quando prestou serviço no navio nos anos 70, ressalva que “um ou outro caso” de “falsos doentes” ocorria entre rapazes com menos de 29 anos que, sem experiência de pesca, partiam para a faina do bacalhau para escapar à Guerra Colonial. “Mas também havia doentes que minimizavam os sintomas” para não perderem o salário, adianta. Dos dois anos que esteve a bordo no “Gil Eannes”, onde “consultava 40 a 50 doentes por dia” e operava, o agora cardiologista lembra, com “emoção”, a “grande alegria” que sentia ao “acertar no diagnóstico” clínico de doentes a partir das indicações transmitidas, por rádio, pelos enfermeiros dos barcos de pesca.


“Foi uma experiência extraordinária mas difícil”, confessa, acrescentando que “o trabalho era tanto” que fazia esquecer “as noites de grande angústia” paradas no mar, entre icebergues e cargueiros em movimento, “mar que odiava”. Entre as doenças dos pescadores mais frequentes que Pedro Abreu Loureiro tratou contavam-se “problemas digestivos”, infecções nas mãos provocadas por anzóis ou queimaduras causadas por explosões. Já as operações relacionavam-se com traumatismos e amputações de membros com gangrena. Nenhum doente lhe morreu nos braços.


Mandado construir nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo pelo Grémio de Armadores de Navios de Pesca do Bacalhau, o “Gil Eannes” foi lançado ao mar em 1955, ano em que Portugal tinha uma frota pesqueira na Terra Nova e na Gronelândia de 70 barcos e cerca de cinco mil homens. Da sua assistência beneficiaram não só pescadores portugueses mas também ingleses, franceses, canadianos, russos, espanhóis, italianos, dinamarqueses, suecos, noruegueses, polacos e belgas, que não dispunham de semelhante apoio logístico.


Num gesto de reconhecimento, o “Gil Eannes” foi chamado pelos canadianos de “Navio Mãe da Frota Branca” e pelos portugueses de “Misericórdia do Mar”, apesar de ter o nome do cargueiro a vapor alemão que auxiliou pescadores no Mar do Norte entre 1927 e 1942.


O paquete dispunha de um hospital equipado com consultório médico, bloco operatório, gabinetes de radiologia e estomatologia, laboratório de análises clínicas, sala de esterilização e desinfecção, enfermarias, incluindo as destinadas para doentes infecto-contagiosos, e capela.


Desempenhava funções de rebocador, quebra-gelo, correio, distribuidor de mantimentos, água, combustível, isco, redes e cabos de pesca. “O navio era um verdadeiro embaixador. Quando chegávamos ao Porto de St. John’s, no Canadá, para abastecer, éramos muito bem recebidos. Fui convidado por casas de famílias onde estive com todas as mordomias”, relata o antigo electricista Pedro Lima Ribeiro. A fama do “Gil Eannes” levou-o a ser “visitado por médicos e enfermeiros” nos portos por onde passava e a receber livre-trânsito quando partia ou chegava, de emergência, a St. John’s.Era neste porto que a correspondência, que ascendia a milhares de cartas, era recolhida e posteriormente entregue aos navios. “Como as cartas se acumulavam”, porque o correio só era recebido quando o barco aportava em St. John’s, “liam-se primeiro as mais antigas e depois as mais recentes”, descreve Pedro Ribeiro, acrescentando que o pouco tempo livre que sobrava das tarefas a bordo era preenchido com a pesca à linha de bacalhau, anedotas, jogos de cartas, uma “passa” num cigarro, muita conversa, a leitura de um jornal com “dois meses de atraso” ou um livrinho de “cowboys”.


O “Gil Eannes” esteve ao serviço da frota bacalhoeira até 1973. Contudo, dez anos antes, por dificuldades de exploração, suportada pelos armadores, foi autorizado, por decreto governamental, a efectuar, fora das campanhas da pesca do bacalhau, viagens de comércio, como navio-frigorífico, e de passageiros para África do Sul, Canadá, Noruega, Dinamarca, Espanha e Austrália. Mais tarde, transportou refugiados de Angola. Até ser recuperado em finais da década de 90, o navio enfrentou diversas vicissitudes: esteve arrestado e abandonado durante vários anos na Doca de Alcântara, em Lisboa, antes de ser resgatado a um sucateiro de Alhos Vedros, Moita.Actualmente, a embarcação é propriedade da Fundação “Gil Eannes”, que a mantém ancorada em Viana do Castelo como museu e pousada da juventude.


De vez em quando, Pedro Lima Ribeiro, natural de Viana do Castelo, mata saudades do tempo em que esteve embarcado como electricista no “Gil Eannes”. Entra no navio mas sai com uma pena: “Gostava de vê-lo a navegar”.»


Elsa Resende (agência Lusa), in O Primeiro de Janeiro, 29-7-2007

LUIS MIGUEL CORREIA said...

O Capitão do Gil Eannes nessa época era o Cte. Chinita, se não estou em erro...

Anonymous said...

Sailor Girl:
O comandante do Gil Eannes a seguir ao Comandante Mário Esteves, foi António Manuel Papão Chinita. E o último capitão de bandeira foi o comandante Gaspar.

Anonymous said...

Um capelão do "Gil Eannes", sem pensar nada: Padre Sá Rosa.
Posso procurar no meu baú e encontro muitos mais nomes.

Anonymous said...

Este "Gil Eannes" de 1955 teve três comandantes:
1 - João Pereira Ramalheira (o Vitorino);
2 - Mário Fernandes Cardoso Esteves;
3 - António Manuel Papão Chinita.
O capitão Vitorino já vinha do " Gil Eannes" velho, foi substituido pelo capitão Mário Esteves para a campanha de 1959, vindo do arrastão "Álvaro Martins Homem", mais tarde o "Argus" de redes de emalhar da Parceria Geral de Pescarias e finalmemte o capitão Chinita para a campanha de 1972, vindo do arrastão "Senhora do Mar".

Anonymous said...

Espectaculares estes depoimentos em relação a este grande navio, só queria era rectificar um pequeno detalhe, quando a Sailor Girl diz que na campanha de 1958 naufragaram 8 navios, deveria ter dito 6. Não é importante, mas assim é que está correto. Saudações amigáveis (Marinheiro de Abordagem)

Raquel Sabino Pereira said...

Obrigada. Foi assim que saiu na edição de «O Primeiro de Janeiro» de 29-7-2007, mas impõe-se o rigor.

Já agora, o Marinheiro de Abordagem sabe quem era o CAPELÃO na altura?